Thursday, May 17, 2007

O "tiro" ao funcionário público

Dizer mal da administração pública e dos funcionários públicos em geral tornou-se numa espécie de desporto em Portugal, tipo fazer "tiro" ao funcionário público.
Não há português que ao sair do trabalho, no final do dia quando vai ao café do bairro beber a cervejinha da ordem com os amigos, não deite a sua achega para uma fogueira que já de si arde em lume intenso.
"A função pública isto, os funcionários públicos aquilo, etc". Tornou-se como que uma espécie de passatempo nacional, ver quem consegue dizer pior da administração pública portuguesa.
A única classe que defende os funcionários públicos em Portugal é adivinhem?! Sim, é isso mesmo os próprios funcionários públicos.
Não vou sequer tentar comparar aqui o público com o privado até porque iria estar a falar de uma realidade que desconheço. Nunca fui funcionário público (mas gostava). Sou sim funcionário de uma pequena empresa privada e já trabalhei em várias outras e é essa a realidade que conheço.
Ser aluno do 2º ano do curso de Administração Pública não me faz ter a pretensão de saber como lá se trabalha para julgar.
Mas então porque dizemos tanto mal dos nossos funcionários públicos? A resposta (ou as respostas) parece-me à partida simples. Só nunca ninguém se deu ao trabalho de pensar nela. Não, não vou ser eu o "génio" que descobriu a pólvora, só pretendo dar a minha opinião.
Dizemos mal dos funcionários públicos em primeiro lugar porque podemos optar pelo bar onde vamos à noite beber um copo, mas não podemos escolher os serviços públicos que temos de utilizar, tornando-os assim um alvo fácil.
Dizemos mal da função pública porque pagamos demasiados impostos para sermos tão mal atendidos como de facto acontece na grande maioria das vezes.
Parece-me também que no fundo todos temos alguma inveja de certas regalias que eles têm. Acho incrível, mas no nosso país em tudo se tenta nivelar por baixo, ou seja, se por ventura o meu vizinho do lado tem algo que eu não tenho a minha reacção não é querer ter também, é sim qualquer coisa deste género - se eu não posso ter ele também não. E não estou a falar de carros nem de televisores plasma.
Dito assim, até parece que não existem pessoas com regalias e privilégios em demasia neste país, é um facto que existem. E existem até em demasia, mas elas não estão entre os nossos vizinhos, não comem nos mesmos restaurantes que nós, nem frequentam os mesmos sítios que nós, na verdade por vezes parece que nem saem à rua. Essas regalias pertencem aqueles que nós normalmente nem vemos, naqueles que mandam, nos que estão sempre na "sombra". São aqueles que ano após ano saltam de empresa pública em empresa pública a troco de elevadas indemnizações que todos nós pagamos a troco dos nossos impostos. São aqueles que se reformam aos quarenta anos, com reformas ainda por cima milionárias.
A política em si não dá muito dinheiro o que na realidade dá dinheiro é o que vem a seguir, que é exactamente o que referi anteriormente.
A administração pública em Portugal não me parece ter funcionários a mais. Parece-me sim, ter chefes a mais.
Vão-nos atirando areia para os olhos com as regalias dos pequenos para que não vejamos as muitas regalias dos grandes, e nós, cá vamos nos entretendo a dizer mal dos pequenos.
Parece-me no entanto que os funcionários públicos são em última instância vítimas de si próprios. Enquanto classe são incapazes de admitir as vantagens que apesar de tudo ainda têm (até quando vamos a ver). Ainda não perceberam que a sua permanente vitimização não lhes trás nenhumas vantagens, antes pelo contrário.
Um bom funcionário público tal como o nome indica, é alguém que é suposto trabalhar para todos nós, é alguém que é pago por todos nós, deveriam por isso ter uma certa vocação de serviço público. Esta vocação passa por perder mais tempo a explicar como funciona um requerimento, passa por escrever esse mesmo requerimento a quem não sabe escrever. Passa essencialmente por servir cada pessoa da maneira que ela mais precisa.
O estado, ao pretender gerir de uma forma empresarial algo que nem tão pouco é suposto dar lucro, tem-se demarcado das suas responsabilidades sociais. O mais grave é que nem com este tipo de medidas se consegue conter o tão falado défice.
Está na hora de pensarmos se o motivo pelo qual isso acontece se deve aos funcionários públicos ou por outro lado às políticas completamente disparatadas que os sucessivos governos têm seguido.
Todos os governos quando chegam ao poder, pretendem fazer uma reforma na administração pública tornando-a desta forma, num sector, sem um rumo definido. Não se percebendo muito bem qual é a estratégia que se está a seguir actualmente, muito menos a que se irá seguir no futuro.
As sucessivas reformas têm contribuído para um aumento de instabilidade, para o aumento da carga fiscal, para o aumento da carga burocrática e para o descontentamento geral dos funcionários que estando descontentes não vão melhorar em nada os seus desempenhos profissionais.
Não nos podemos esquecer do congelamento dos ordenados e das progressões das carreiras, matéria que já teve tempo mais do que suficiente para ter sido resolvida a bem da motivação dos quadros da função pública. Os funcionários já deviam de conhecer as regras com que estão a jogar.
Neste momento o Estado já deveria ter criado mecanismos que permitissem poupar e ao mesmo tempo manter as progressões das carreiras e os aumentos salariais. Num país com uma inflação sempre em crescendo como o nosso não é fácil estar tanto tempo sem ser aumentado, em particular quem não ganha tanto como isso. E sim, isto é perfeitamente viável. Basta para isso que não se verifiquem situações de um claro despesismo a que assistimos todos os dias, quer nos telejornais quer quando nos deslocamos um qualquer serviço.
É também muito mau, quando sempre que existe uma crise económica, social e financeira como a que atravessamos neste momento se faz passar a mensagem de que os únicos culpados são os funcionários públicos.
Devíamos todos tentar ter um pouco de bom senso, tanto nas críticas como na defesa da administração pública. Devemos criticar o que está mal e louvar o que está bem (sim, há coisas que estão bem). devemos criticar sem maltratar e defender sem atacar.
Quando falamos mal da função pública devemos lembrar-nos de todas as condicionantes que acima tentei referir. Os funcionários públicos tal como a sua designação indica deviam trabalhar para servir o povo todo de maneira igual sem distinção de credos raças ou estratos sociais. Nunca se deveriam esquecer disso.

Até um próximo "post"

O vosso amigo:
Mário

No comments: